Universo Paralelo #15: Resenha Trilogia A Seleção

Ler a trilogia de Kiera Cass foi algo muito inesperado. Quando ouvi falar pela primeira vez sobre A Seleção há algum tempo, a premissa da história não me agradou (e ainda não me agrada): pelo que eu sabia, me parecia um The Bachelor literário (aquele programa americano em que várias mulheres disputam quem vai se casar com um homem). O impulso para ler o primeiro livro foi devido ao projeto Conversa Literária, em que este livro será o próximo a ser abordado (conheça mais sobre o projeto nesse link). Então porque eu continuei? Nem eu sei na verdade. Porque ao final do primeiro livro, que não era nada convincente, eu pensei: eu mereço um final para essa história, não é possível. E depois de três livros (que poderiam muito bem ser resumidos em dois livros curtos) pude tirar minhas conclusões definitivas sobre a série.

SPOILER ALERT: As resenhas de A Elite e A Escolha, obviamente, contêm alguns spoilers sobre o enredo dos livros anteriores. Minhas conclusões sobre a trilogia estão no final do post.

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Livro: A Seleção (The Selection)

Autora: Kiera Cass

Lançamento: 2012 (Brasil e EUA)

Editora: Seguinte

Páginas: 368

Skoob: 4,6

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Sinopse

Para trinta e cinco garotas, a “Seleção” é a chance de uma vida. Num futuro em que os Estados Unidos deram lugar ao Estado Americano da China e mais recentemente a Illéa, um país jovem com uma sociedade dividida em castas, a competição que reúne moças de dezesseis e vinte anos de todas as partes para decidir quem se casará com o príncipe é a oportunidade de escapar de uma realidade imposta a elas ainda no berço. É a chance de ser alçada de um mundo de possibilidades reduzidas para um mundo de vestidos deslumbrantes e jóias valiosas. De morar em um palácio, conquistar o coração do belo príncipe Maxon e um dia ser a rainha.

Para America Singer, no entanto, uma artista da casta Cinco, estar entre as Selecionadas é um pesadelo. Significa deixar para trás Aspen, o rapaz que realmente ama e que está uma casta abaixo dela. Significa abandonar sua família e seu lar para entrar em uma disputa ferrenha por uma coroa que ela não quer. E viver em um palácio sob a ameaça constante de ataques rebeldes.

Então America conhece pessoalmente o príncipe. Bondoso, educado, engraçado e muito, muito charmoso, Maxon não é nada do que se poderia esperar. Eles formam uma aliança, e, aos poucos, America começa a refletir sobre tudo o que tinha planejado para si mesma — e percebe que a vida com que sempre sonhou talvez não seja nada comparada ao futuro que ela nunca tinha ousado imaginar.

 

Em A Seleção, a história é contada em primeira pessoa pela protagonista, America Singer, uma garota que habita o país fictício Illéa, cuja sociedade é dividida em castas, que determinam a atividade que seus membros exercem, e vai de um (a realeza) a oito (sem-teto, deficientes). Ela é da casta Cinco, a dos artistas, e trabalha cantando e tocando instrumentos, e por ser de uma das classes mais baixas, ela e a família passam por muitas dificuldades financeiras. America é apaixonada por um garoto de uma família amiga da sua, Aspen, da casta Seis. A trama gira em torno da Seleção, evento que determina que plebeia será a princesa de Illéa e se casará com o príncipe, nesse caso, o príncipe Maxon. Após se inscrever por motivos financeiros, já que as famílias das Selecionadas recebem dinheiro, ela é escolhida, algo que ela nunca esperava, e a maior parte do livro se passa no tempo em que ela está morando no palácio.

Primeiro aviso (que eu gostaria de ter recebido): dizer que este livro se trata de uma distopia é um exagero. Se você espera guerras, grandes conflitos, discussões e reflexões políticas e sociais, esse livro definitivamente não é para você. Os conflitos políticos e sociais são apenas um pano de fundo na história, servindo mais para “causar um drama” nos relacionamentos de America. A ideia está presente, só que a autora não dá muito destaque a isso, nem se importa em entrar em mais detalhes. A história que realmente está sendo contada é o romance, e o foco está no triângulo amoroso America, Maxon, Aspen.

A narração em primeira pessoa de America, tenho de admitir, é um dos pontos positivos do livro: a personagem é bem impulsiva e espontânea, e a imprevisibilidade de suas ações deixam o livro mais divertido. No entanto, como não tem muitos acontecimentos marcantes e boa parte do enredo se enquadra na rotina dela na competição, a história perde no quesito dinamicidade. A própria competição em si não tem lá muitas emoções nem conflitos, e a ação fica por conta das invasões rebeldes que ocorrem por vezes no palácio.

 

“— E você, pelo que luta?
— Na verdade, estou aqui por engano.

— Engano?
— É, mais ou menos. Bem, é uma longa história… Estou aqui. E não estou lutando. Meu plano é aproveitar a comida até você me chutar.”

America

 

Os rebeldes e o próprio sistema de governo de Illéa e sua história (que se passa após a Quarta Guerra Mundial), por não serem muito bem trabalhados, são mal estruturados. É possível perceber mais essa característica em A Escolha, porém apesar de algumas pistas que é possível ter ao longo do livro, tive a impressão de que esses aspectos foram mal explicados. É bom se manter atento a essas pequenas pistas que a autora deixa: em vários momentos ao longo da trilogia, por exemplo, Aspen fala sobre algumas injeções dadas aos soldados (imagino que o rei injetava anabolizantes nos soldados a fim de prepará-los mais rapidamente para a guerra que Illéa trava contra a Nova Ásia).

 

“Nunca pensei em questionar a ausência de verdades até dar de frente com ela. Por que o rei queria que tivéssemos apenas uma vaga noção dos fatos?”

 

Quando se trata de desenvolvimento de personagens, foi uma decepção em geral. Os personagens secundários e até Aspen me parecem ser “rasos” demais. A impressão que tive é que a autora não se deu ao trabalho de aprofundar seu desenvolvimento, nem trabalhar a personalidade desses personagens, apesar de alguns terem destaque na história. A exceção fica por conta de America e Maxon, que tem um desenvolvimento ao longo da história e é possível conhecê-los melhor a cada situação.

 

 “Nenhuma das opções me parecia muito boa. E a ideia de entrar em um concurso que o país inteiro acompanharia só para ver um riquinho esnobe escolher a moça mais linda e sonsa do grupo para ser o rosto calado e bonito que apareceria ao lado dele na TV… era o bastante para me fazer gritar. Haveria humilhação maior?”

 

Os clichês da história foram um grande percalço na minha leitura: romance água-com-açúcar, triângulo amoroso, uma “vilã” que implica com a protagonista… Acredito que essas características tão exploradas pelos YA poderiam ter sido descartadas pela autora, e se assim fosse teriam enriquecido a história.

Um dos absurdos que vi pelas resenhas que circulam pelos blogs e canais literários é que muitos comparam A Seleção a Jogos Vorazes. Antes de comentar isso, gostaria de saber quem inventou esse terrível hábito de comparar qualquer distopia a Jogos Vorazes.  Não é comparando histórias completamente diferentes que se chega a um parâmetro de qualidade.  E esse é exatamente o que ocorre nesse caso: a distopia de Suzanne Collins e o romance de Kiera Cass não poderiam ser mais diferentes. Enquanto um tem um forte teor político, o outro não desenvolve esse lado. No entanto, me pergunto se os conceitos de castas e reality shows tenham sido inspirados na Panem de Collins.

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Nota do livro: 3/5

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Trata-se de um livro de romance com uma linguagem fácil e voltada para o público adolescente, com um cenário distópico discreto. Por vezes é divertido, mas simplório no conteúdo.

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Livro: A Elite (The Elite)

Autora: Kiera Cass

Lançamento: 2013 (Brasil e EUA)                    

Editora: Seguinte

Páginas: 360

Skoob: 4,5


 


Sinopse

A Seleção começou com 35 garotas. Agora restam apenas seis, e a competição para ganhar o coração do príncipe Maxon está acirrada como nunca. Só uma se casará com o príncipe Maxon e será coroada princesa de Illéa. Quanto mais America se aproxima da coroa, mais se sente confusa. Os momentos que passa com Maxon parecem um conto de fadas. Quando ela está com Maxon, é arrebatada por esse novo romance de tirar o fôlego, e não consegue se imaginar com mais ninguém. Mas sempre que vê seu ex-namorado Aspen no palácio, trabalhando como guarda e se esforçando para protegê-la, ela sente que é nele que está o seu conforto, dominada pelas memórias da vida que eles planejavam ter juntos.

America precisa de mais tempo. Mas, enquanto ela está às voltas com o seu futuro, perdida em sua indecisão, o resto da Elite sabe exatamente o que quer — e ela está prestes a perder sua chance de escolher. E justo quando America tem certeza de que fez sua escolha, uma perda devastadora faz com que suas dúvidas retornem. E enquanto ela está se esforçando para decidir seu futuro, rebeldes violentos, determinados a derrubar a monarquia, estão se fortalecendo — e seus planos podem destruir as chances de qualquer final feliz.

 

Como o aviso de spoiler já foi dado, já comento que o final de A Seleção foi decepcionante. Eu, que esperava o fim da competição, ou alguma coisa grandiosa, só vi que a America ficou entre as seis últimas competidoras, sendo parte da Elite, o que já estava meio óbvio àquela altura. Em A Elite, esperava mais dos rebeldes, dos segredos do rei e outras tramas.

Minha expectativa em parte foi atendida: a autora revelou alguns dos segredos sobre os rebeldes, suas intenções, e sobre como Illéa foi formada e os segredos por trás do governo do rei. Já desconfiava de algumas dessas intenções, e com alguns acontecimentos marcantes durante e ao final do livro, a história teve um pouco mais desse tom político.

“Fechei o livro com força. Estava confusa e frustrada. Havia algo que eu não sabia? Derrubar que sistema?”

No entanto, esses detalhes foram pouco abordados, e a maior parte da história se trata, novamente, dos romances de America, e infelizmente, o triângulo amoroso foi explorado ao máximo. O enredo do livro, que perdeu muito com o exagero dessa temática, se baseia basicamente na indecisão de America e nas decisões cada vez mais absurdas que ela toma. Quando eu achava que a história iria se desenvolver e caminhar para um desfecho, America estava mais uma vez indecisa, entre altos e baixos, quase como um loop infinito. Chegou um ponto do livro que eu estava mais ou menos assim:

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“Todos me uniam a ele: ele ainda estaria à minha espera; ele me conhecia melhor que ninguém; nós éramos um; uns meses no palácio não podiam apagar dois anos. Não importa o que acontecesse, Aspen sempre estaria ao meu lado.”

America sobre Aspen

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“Porque então eu era dele. Eu sabia. Nunca estive tão certa. […] Não podia imaginar nada forte o bastante para roubar aquela felicidade.”

America sobre Maxon

Uma das melhorias em relação ao anterior, ainda que tímida, é que com a diminuição do número de competidoras foi possível conhecer mais sobre as outras Selecionadas, além de outros personagens secundários. Houve algumas grandes surpresas, que me levaram a acreditar em um final promissor para a série.

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Nota do livro: 2,5/5

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Um regresso em relação ao primeiro livro. Apesar de ter mais acontecimentos e mais informações sobre o governo de Illéa, a história se prende à indecisão cansativa de America sobre Maxon e Aspen.

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Livro: A Escolha (The One)

Autora: Kiera Cass

Lançamento: 2014 (Brasil e EUA)

Editora: Seguinte

Páginas: 352

Skoob: 4,6

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Sinopse

A Seleção mudou a vida de trinta e cinco meninas para sempre. E agora, chegou a hora de uma ser escolhida. America nunca sonhou que iria encontrar-se em qualquer lugar perto da coroa ou do coração do Príncipe Maxon. Mas à medida que a competição se aproxima de seu final e as ameaças de fora das paredes do palácio se tornam mais perigosas, América percebe o quanto ela tem a perder e quanto ela terá que lutar para o futuro que ela quer. Desde a primeira página da seleção, este best-seller #1 do New York Times capturou os corações dos leitores e os levou em uma viagem cativante … Agora, em A Escolha, Kiera Cass oferece uma conclusão satisfatória e inesquecível, que vai manter os leitores suspirando sobre este eletrizante conto de fadas muito depois da última página é virada.

 

Ao contrário do que diz na sinopse acima, o final da trilogia não foi satisfatório. Apesar de ter notáveis melhorias, está longe de ter elevado a série A Seleção no meu conceito.

Inicialmente, quando achei que America tinha finalmente se decidido e fosse se dedicar mais a influenciar as decisões políticas do país, o romance é explorado em excesso novamente: só que agora, Aspen se tornou o estepe: se as coisas com Maxon não dessem certo, lá estava Aspen como prêmio de consolação. E Maxon, que passou por muitas mudanças, se aproxima das outras garotas devido aos conflitos de America (como se os do livro anterior não fossem suficientes).

 “Mesmo naquele momento, em que eu esperava ser escolhida por Maxon, um mundo sem Aspen parecia inconcebível.”

A trama política, que inicialmente foi discutida e teve America como uma das maiores articuladoras, foi deixada de lado ao longo do livro, e as explicações para vários desses eventos não foram dadas ou simplesmente foram finalizadas com pressa. A impressão que tive foi que a autora se preocupou em desenvolver a história do casal principal e o resto da história foi tratado de forma rápida e superficial. Felizmente, a autora desenvolveu mais seus personagens secundários, lhes dando papéis mais efetivos nas tramas, reviravoltas e crescimento no enredo, mudando o conceito que se tinha sobre os mesmos.

“— Não desejar a coroa talvez a torne a melhor pessoa para usá-la.”

 

O final da história foi previsível, e as surpresas em si não acrescentaram muito à história em si. Um final feito para agradar os fãs, e só.

Nota do livro: 3/5

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Uma conclusão superficial para a trilogia, que se preocupou mais em dar um desfecho ao triângulo amoroso e à vida amorosa de America do que explicar as questões em aberto da política e das revoltas em Illéa. Os personagens secundários finalmente puderam ter mais destaque e mais construção de personalidade.

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Sobre a trilogia:

Apesar da fachada distópica (que é apenas um background), a trilogia aborda em essência o romance (por muitas vezes clichê), com tímidas tramas sobre política e sociedade. Destinada ao público adolescente, com uma história rasa e pouco desenvolvimento de personagens, não me surpreendeu positivamente.

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assinatura karen caires

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